CARTA ABERTA ÀS MINHAS OVELHAS.
Weslei Odair Orlandi
Queridas ovelhas,
Ando inquieto. Ser pastor, ao
contrário do que muitos pensam, não é tarefa fácil. “Pastor não trabalha”,
gracejam alguns. “Pastor ganha bem”, alfinetam outros. Essas e tantas outras “brincadeiras”
de péssimo gosto em alguns momentos me fazem pensar se vale a pena essa
jornada. Penso ter razões para isso:
Não escolhi ser pastor; fui
escolhido. Não tive, como muitos de vocês, a opção de escolher entre uma
profissão e outra. Foi involuntária a chama que, de uma hora para outra,
começou arder em meu coração. Fui abduzido do mundo dos normais e, de repente,
lá estava eu, nos púlpitos, nas casas, pregando, aconselhando, visitando,
intercedendo... E agora isso! “Senhor, tu
me enganaste, e eu fui enganado; foste mais forte do que eu e prevaleceste. Sou
ridicularizado o dia inteiro; todos zombam de mim”, Jeremias 20.7, NVI.
Não tenho superpoderes; “sou
homem como qualquer outro homem” (Atos 10.26). Ainda que eu queira, não
consigo. Minha humanidade me consome, me cerca, me humilha, me vence. Agonizo
entre os anseios de ajudar a todos e as incessantes lembranças de que a vida
segue seus caminhos invariáveis e não há muito a fazer.
Não sou carismático. A virtuose
de tantos não passou nem perto de mim. Não domino a oratória, não encanto
quando canto, não sei a diferença entre o Dó e o Lá, não sou midiático,
emblemático, não contagio multidões, não sei chorar enquanto falo, sorrir
enquanto exorto, representar enquanto descrevo. Sou normal; só isso.
Não pastoreio multidões, não
batizo milhares; apenas um pequeno rebanho me foi confiado. Aos domingos não
encho o templo, não arrecado milhões, não recebo fortunas. Sobrevivo com pouco,
me alegro com pequenos ajuntamentos. Talvez me falte a gana e o domínio das
técnicas de superação. Devo ler muito pouco sobre os tais “7 pulinhos para
uma vida de sucesso”.
Não tenho amigos; e os que tenho,
não são tão próximos assim. De noite, faço nadar em lágrimas minha cama (não
tenho onde chorar!). De manhã, sorrio, aceno. Está tudo bem! Sou pastor e
pastor não tem problemas, não se sente só, não fica triste, não desabafa, não
fraqueja, não peca, não perde. Pastor que é pastor faz “oração forte”, tem
acesso livre ao trono celestial, caminha com anjos, conversa com Deus, tem
visões. Quem vive assim, pra que amigos?
Não conto com muitos. Na verdade,
alguns de vocês parecem não se importar com meus clamores, com a Igreja, com as
necessidades prementes, com os finais de semana, com os cultos da semana.
Talvez a culpa seja mesmo minha. Preciso ser mais criativo, mais ousado,
dinâmico, espetacular, fervoroso.
Tenho chorado e arquejado sob o
peso de tantas vergonhas. Nas ruas percebo o desprezo. Já nem se dão mais ao
trabalho de cobrir o rosto enquanto gracejam. “O que fazer?”, indago a mim
mesmo. Não consigo parar. Não posso, não quero! Covardia? Falta de opção? Não,
não pode ser isso; e não é!
Ser pastor, a mais humilhante das
tarefas humanas, também tem o seu lado bom. Deve ter; não é possível! Ao contrário de muitos [e do que muitos
pensam], eu não negocio a palavra de Cristo visando lucro; antes, em Cristo
falo diante de Deus, com sinceridade, como homem enviado por Deus, 2 Coríntios
2.17, NVI – acréscimo meu. Sei que amando mais, corro o risco de ser menos
amado. Tudo bem. “De boa vontade, por
amor a [vocês], gastarei tudo o que tenho e também me desgastarei pessoalmente,
2 Coríntios 12.15, NVI.
Estou sendo insensato. Fui
obrigado a isso. Não sou inferior aos “superpastores”, embora eu nada seja. O
legado de um pastor não depende das grandes obras, mas da sua perseverança, do
seu amor, do seu empenho, da sua consciência. Seja como for, não pretendo
recuar. Agora é tarde! Embora todos busquem os seus interesses e não os de
Cristo, eu já fiz minha escolha: “o que
para mim era lucro, passei a considerar como perda por causa de Cristo”,
Filipenses 3.7, NVI. Ainda não cheguei lá, mas vou chegar. Também fui
alcançado por Cristo, prossigo para o alvo. Haverá um prêmio. Haverá um
consolo. Se já alcancei maturidade, então, é assim que devo ver as coisas. E
vejo... Ah! É lindo!
Meu sucesso, minha conquista,
meus motivos, minha garra não foram dizimados. Alguns de vocês ainda fazem
valer a pena. Eu sei que um dia olharei para os lados e os verei sorrindo enquanto caminham pelas imensidões do céu infinito. Nesse dia, quando
isso acontecer, olharei para o meu Senhor e ele, num olhar – bastará um – me fará entender qual era a grandeza da minha missão.
Até lá, queridas ovelhas, não
permitam que ninguém os julgue pelo pastor que têm. Fiquemos com as palavras do
querido e valente Lutero: “Não somos o que devemos ser, mas pela graça de Deus,
sabemos que já não somos mais o que éramos”. Isso basta!
Amo vocês!
Eu, vosso pastor e servo de
Cristo.
Comentários
"Ser, ou não ser, eis a questão". Ser pastor, de fato, não é e nem tem sido fácil, no entanto, não é opcional. Também congratulo com suas incertezas, tristezas, inseguranças, etc. Mas vamos prosseguir, Deus nos confiou um rebanho e o que vale é o chamado. Estamos juntos! Vamos fazer a vontade de Deus e a recompensa Ele também nos dará. Sucesso, primão. Deus o abençoe!