Prefiro viver no Egito


Weslei Odair Orlandi



“Prefiro viver no Egito”, disse um jovem cristão egípcio ao escritor Philip Yancey. Apesar das perseguições e tolerância quase zero à minoria cristã em seu país, esse jovem não quer viver na América. “Aqui não temos pornografia, álcool e pouco sexo antes do casamento, e me sinto seguro andando pelas ruas”, acrescentou ele.
Quando paro para pensar que nós do ocidente nos gabamos de ser maioria cristã, sinto-me envergonhado diante de um testemunho desses. Nós que temos total liberdade para professar a fé cristã deveríamos ser de fato os ícones da mensagem de Cristo. Entretanto, o que temos visto são pessoas que irresponsavelmente assumem apenas nominalmente a nomenclatura de cristãos, mas que vivem de maneira dissoluta ignorando por completo os princípios santos da Palavra.
Numa tendência antagônica ao Evangelho os cristãos hodiernos tendem a produzir valores que nada lembram os ideais do Reino dos Céus. Somos conhecidos por nossos templos com arquiteturas clássicas e modernas e por nossa música gospel cada vez mais popular; estamos na mídia e reunimos com facilidade um número cada vez maior de seguidores, mas nem por isso estamos honrando o nome de Cristo com proficiência. Talvez devêssemos prestar mais atenção aos ensinamentos básicos do cristianismo enveredando-nos pelos caminhos do amor, da compaixão, da ética moral e da verdadeira santidade.
Ficamos horrorizados quando os “não-cristãos” olham para nós e com ar zombeteiro nos incluem em suas chacotas. Sabemos distinguir um cristão comprometido, que aceita ser um discípulo verdadeiro de Jesus, de um “cristão domesticado”. Nem todos, porém, sabem fazer essa distinção. Boa parte do mundo tira conclusões a nosso respeito a partir do todo. Quando pastores inescrupulosos são presos acusados de estelionato; quando moças ficam grávidas antes do casamento; quando rapazes são flagrados em lan-houses flertando com sites pornográficos; quando casais se traem e abandonam um ao outro; quando clientes engrossam as listas de inadimplência, é aos cristãos em geral que eles criticam, e não apenas aos implicados.
Não entenda que minhas afirmações sobre certas perversões do cristianismo entre nós têm a intenção de dizer que está tudo arruinado. Não está! Existem ainda sete mil homens que não dobraram seus joelhos. No entanto, ratifico a idéia de que nossa visibilidade no cenário nacional como povo de Deus tem sido comprometida muitas vezes por questões que em vez de “glorificar ao Pai que está nos céus” (Mt 5:16), faz com que “o nome de Deus seja blasfemado entre os gentios por nossa causa” (Rm 2:24).
Ora, sempre que isso acontece, através de nossos atos estamos fazendo com que o mundo despreze Deus e se escandalize rejeitando qualquer possibilidade de se tornar um com Cristo. Não podemos permitir equívocos. O mundo não tem outra maneira de ver a Deus a não ser através da Igreja. Se a Igreja não vive e não reflete o caráter de Cristo, então o mundo blasfema de nós. Creio ser esta a lição que nos dá a experiência de João em Patmos. Quando ele ouviu a voz do que falava com ele, voltou-se, e viu, “sete candelabros de ouro e entre os candelabros alguém semelhante a um filho de homem” (Ap 1:12-13). A primeira visão de João não foi Cristo (aquele que falava com ele), mas a Igreja (os sete candelabros de ouro). A lição é clara: quando alguém ouve falar sobre Cristo, na tentativa de vê-lo, vai primeiro à igreja. Cristo está dentro dela. Contudo, se ao invés de encontrar ali homens e mulheres verdadeiramente comprometidos com a verdade que dizem crer, for apresentado a pessoas cujo testemunho é duvidoso e às vezes escancaradamente vergonhoso, fugirão e ficarão impedidos de experimentar o grande amor de Deus.
Com quais valores estamos realmente comprometidos? Estamos de fato defendendo as mesmas causas que Deus? Com que intensidade estamos refletindo a santidade do Salvador? A finalidade última de Deus é que a Igreja exista para o louvor da sua glória e não que ela aspire por enriquecimento e conforto; é que ela fixe os olhos, não naquilo que se vê, pois o que se vê é transitório; não naquilo que tem lugar apenas aqui e agora, mas no que não se vê e, contudo é eterno.
Que nosso empenho seja com a justiça, com a pureza de espírito, com a busca da presença de Deus, com a prática do amor e da misericórdia, com o fervor do Espírito, com o ser sal e luz, com a criação de possibilidades de salvação para todos, com a humildade e com o testemunho vivo e eficaz. Que não sejamos conhecidos por rótulos e máscaras, mas por sermos portadores da “síndrome de Jesus”. Afinal, o que os outros pensam sobre nós é importante sim. Com essa afirmação estão de acordo todos os autores das Escrituras.

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