Aconselhem-me, por favor.


Weslei Odair Orlandi


Dizem que se conselho fosse bom não seria dado, mas vendido. Discordo. Graças a Deus os conselhos não são vendidos (pelo menos não na maioria das vezes) e geralmente são bons. É fato posto que somos mais inclinados a aconselhar do que a receber conselhos. Talvez por falta de humildade ou até mesmo pela “humilhação” de sermos aconselhados, preferimos mais o papel de conselheiros. Aí está a origem das dores e ais. Quantos dissabores evitaríamos se simplesmente apreciássemos os conselhos que ouvimos e que, diga-se de passagem, não são poucos.
Os conselhos existem desde que o mundo é mundo e são úteis para quem deseja conhecer a sabedoria e a instrução; para quem deseja o entendimento, a justiça, o juízo e a equidade; para dar aos simples prudência; aos jovens bom siso e para livrar a alma inadvertida da amarga ruína.
Recordo-me ao escrever sobre conselhos o quanto teria valido a pena Caim ter ouvido os conselhos de Deus no que dizia respeito ao seu irmão Abel. Mas não. Afoito, iracundo e dono de uma pseudo-liberdade, preferiu agir conforme sua consciência. O resultado da indiferença de Caim às admoestações divinas você já conhece. Assassino, maldito, fugitivo e errante na terra, Caim certamente lembrou-se muitas vezes do sábio aviso que a Voz Divina lhe ofereceu antes da barbárie ter sido cometida.
Não consigo esquecer-me também do quanto teria sido útil a Abraão ter levado em conta os conselhos de Deus quanto à necessidade do seu êxodo solitário. O Senhor Deus bem que o preveniu sobre não levar parentes com ele durante a peregrinação. O patriarca, contudo, preferiu ignorar a Voz Amiga e deu no que deu. Ló não só causou-lhe constrangimentos como todos nós, ainda que indiretamente, sofremos hoje as conseqüências da sua indiferença insana.
O livro de Deuteronômio encerra a biografia de Moisés afirmando que ele morreu aos cento e vinte anos de idade sem que seus olhos tivessem se escurecido ou que ele tivesse perdido o seu vigor. Mas, acreditem-me: este não teria sido o final da história se ele tivesse ignorado os conselhos de seu sogro Jetro – e ainda dizem que sogro bom é sogro morto.
Li em algum lugar que “um conselho ignorado, será sempre lembrado”. Nada mais verdadeiro. Precisamos ser aconselhados, sempre. Melhor, precisamos estar prontos para acatar os conselhos. Ouvi-los não basta. Entre ouvir e praticar há um caminho longo a ser percorrido.
Tenho dito aos jovens que, embora ainda inexperientes e afoitos, levam vantagens em muitos aspectos sobre aqueles que já chegaram aos limiares da vida. Primeiro, ainda não definiram totalmente suas vidas em termos de educação, trabalho e família, o que lhes dá a oportunidade de agirem com cautela e sabedoria. Segundo, a vitalidade e a saúde ainda não foram violadas, o que lhes dá condições para lutar, sonhar, planejar e executar projetos. Terceiro, o tempo que viveram ainda é inferior ao tempo que viverão, o que lhes dá tranqüilidade para agirem sem atropelos. Quarto, por serem ainda jovens são, na maioria das vezes, alvo da compreensão e compaixão dos mais velhos, o que lhes dá uma segunda chance para recomeçarem de novo. Porém, é bom que se saiba que na medida em que os anos passam os caminhos se estreitam, o cimento endurece, a quantidade de “ontens” fica maior que a de “amanhãs”. As cobranças se tornam mais implacáveis e os deslizes mais calamitosos. Eis aí, algumas razões porque acredito cegamente que deveriam valorizar mais os conselhos dados pelos mais velhos.
Eu se começasse minha vida de novo, prestaria mais atenção às advertências que ouvi. Por ignorância, insensatez e falta de jeito, desprezei-as muitas vezes. Resultado: os conselhos que não quis ouvir dos lábios de quem me amava, ouvi-os da vida que, a propósito, só abre a boca para falar tarde demais. Assim, hoje, embora o tempo não possa ser rebobinado apresso-me não só a ouvir o que têm a me dizer aqueles que querem o meu bem, como eu mesmo vou ao encalço deles ávido por uma palavra de ponderação e direcionamento.
Sei que muitos continuarão acreditando na falácia do provérbio que citei ao início. Muitos continuarão ignorando que a sabedoria mora com os “idosos” – não necessariamente com os de idade avançada apenas, mas também com aqueles que já palmilharam um pouco mais a estrada poeirenta da vida – e, assim, seguindo seus próprios faros e instintos continuarão a violar preceitos simples da vida e a cometerem desatinos. Eu, porém, como já dei topadas que poderiam muito bem ter sido evitadas, que já fui envergonhado, repreendido e frustrado vezes suficientes para não querer mais vender meus direitos, hoje, grito aos quatro ventos: “Aconselhem-me, por favor”.

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