Dois ou três minutos.
Weslei Odair Orlandi
Somos maus contadores. Aprendemos a pensar apenas na perspectiva do macro e a não dar valor ao micro. É assim que explicamos a nossa efêmera existência: a partir de décadas e anos. Porque a duração da vida é de setenta anos, e alguns, pela sua robustez, chegam aos oitenta, passamos a não perceber a linha tênue que separa a vida da morte.
Foi essa a razão porque Moisés orou a Deus pedindo-lhe que o ensinasse a contar os seus dias. Para quem iria viver cento e vinte anos sem perder o vigor e o golpe de vista, o perigo de não se perceber a finitude da vida era ainda mais provável. Ele preferiu não correr o risco. Entendeu o que é a vida: um sono. Apenas isso. O homem que parece ser tão forte, independente e senhor de si, na verdade, nada é senão a soma de um punhado de terra tirado do chão úmido do Éden mais o hálito divino soprado para dentro de si. Não são poucas as metáforas – humilhantes, inclusive – que atestam sua fragilidade. É assim que o homem foi explicado: como “a erva que cresce de madrugada; de madrugada, cresce e floresce; à tarde, corta-se e seca”; “um conto ligeiro”; “pó da terra”; “carne”; “um vento que passa e não volta”; “vaidade”; “nada”...
Por que pensar nisso justo agora que tudo está dando tão certo? Para ajudá-lo a se localizar em definitivo no relógio da vida. Não julgo prudente deixar de lado a pergunta fatal: Que horas são?
Pense comigo como as coisas passam rapidamente. Há alguns poucos anos atrás e sequer existíamos, agora já nem somos mais tão jovens assim.
Um dos grandes perigos que corremos é o de não darmos conta de que a vida está se esvaindo a cada segundo. Creia-me, estamos morrendo agora; agora mesmo. A língua inglesa capta ainda com maior precisão o assanhamento da morte: just now! É como se estivéssemos num barco que a cada movimento das ondas fica mais e mais longe do cais. Uma viagem sem volta. Um contínuo e silencioso apagar das luzes. Um adeus sem pressa e sem alardes...
É por isso que quanto mais eu penso sobre a “hora” da nossa vida mais intolerante fico com aqueles que não vivem e também com aqueles que apenas vivem. A vida é rara e só passamos por aqui uma única vez. Aos homens está ordenado morrerem.
Fico imaginando quantas pessoas não estão absortas em seus desvarios sem se dar conta da efemeridade sem nome, sem rosto e sem aviso que as cerca e as conduz implacavelmente para o fim de todas as coisas. Não é sábio não aprender a contar os dias, a bem da verdade, a contar os minutos, os segundos, os décimos, os milésimos... Afinal, é deles que se alimentam os anos, as décadas e as eras.
Não pensar na brevidade dos dias que nos são dados é arrogância da pior espécie. Como dizia Rachel de Queirós: “somos imortais, mas não imorríveis”. Pediram a um sábio grego para que elaborasse uma verdade incontestável. Dias depois, após longas horas pensando, o sábio finalmente respondeu: “Tudo passa”.
Bingo! É isso. A vida é um milagre que não se repete. Por isso é inadmissível que não saibamos percebê-la em suas linhas suaves, sutis e traiçoeiras. Existem por detrás dos anos que celebramos uma força ainda maior que raramente conseguimos perceber. São os minutos que nos mantêm afastados da morte.
A respiração é uma função fisiológica do organismo diferente das demais especialmente pelo tempo em que pode deixar de ser exercida. Dois ou três minutos sem respirar, e o organismo começa a dar sinais de graves alterações. Se esse tempo for um pouquinho maior, será incompatível com a vida. Não respirando em dois ou três minutos, poderemos chegar ao coma e daí para a morte, o caminho é ainda mais curto.
Não são os anos que se interpõem entre o dia do nosso nascimento e o dia da nossa morte; são os minutos. Basta que esses minutos sejam antecedidos pelos numerais dois ou três; basta que eles sejam uma única vez suprimidos e, a erva verde seca-se e morre. E o que era já não é mais. E o que viera já se foi.
Principiei dizendo que somos maus contadores. E somos. Concluímos os ciclos da nossa existência a cada trezentos e sessenta e cinco dias. Pensamos no que vivemos e no que viveremos a cada doze meses. Tolice. Precisamos aprender a contar os nossos dias, as nossas horas, os nossos segundos. Não pensem que isso é insegurança ou desconfiança. Confiar em Deus ou a Deus os nossos dias não significa desaperceber-se da velocidade com que a vida flui. Ao invés de celebrarmos com festa, bolo, refrigerantes, brigadeiros, salgados, balões e línguas de sogra cada ano que subimos ao pódio da vida, deveríamos mesmo é ampliar nossa capacidade de exercer o ministério da gratidão a quem nos mantém tão perto, mas também tão longe da morte a cada dia, manhã, hora, minuto e segundo.
Dois ou três minutos. Talvez quatro ou no máximo cinco. Isso é tudo o que temos contra a morte. Razoável mesmo fui Rubem Alves ao escrever: “o relógio não desiste. Continuará a nos chamar à sabedoria. Quem sabe que o tempo está fugindo descobre, subitamente, a beleza única do momento que nunca mais será”.
O tempo voa. O tempo se vai, se esvai. Só vai, não volta.
Somos maus contadores. Aprendemos a pensar apenas na perspectiva do macro e a não dar valor ao micro. É assim que explicamos a nossa efêmera existência: a partir de décadas e anos. Porque a duração da vida é de setenta anos, e alguns, pela sua robustez, chegam aos oitenta, passamos a não perceber a linha tênue que separa a vida da morte.
Foi essa a razão porque Moisés orou a Deus pedindo-lhe que o ensinasse a contar os seus dias. Para quem iria viver cento e vinte anos sem perder o vigor e o golpe de vista, o perigo de não se perceber a finitude da vida era ainda mais provável. Ele preferiu não correr o risco. Entendeu o que é a vida: um sono. Apenas isso. O homem que parece ser tão forte, independente e senhor de si, na verdade, nada é senão a soma de um punhado de terra tirado do chão úmido do Éden mais o hálito divino soprado para dentro de si. Não são poucas as metáforas – humilhantes, inclusive – que atestam sua fragilidade. É assim que o homem foi explicado: como “a erva que cresce de madrugada; de madrugada, cresce e floresce; à tarde, corta-se e seca”; “um conto ligeiro”; “pó da terra”; “carne”; “um vento que passa e não volta”; “vaidade”; “nada”...
Por que pensar nisso justo agora que tudo está dando tão certo? Para ajudá-lo a se localizar em definitivo no relógio da vida. Não julgo prudente deixar de lado a pergunta fatal: Que horas são?
Pense comigo como as coisas passam rapidamente. Há alguns poucos anos atrás e sequer existíamos, agora já nem somos mais tão jovens assim.
Um dos grandes perigos que corremos é o de não darmos conta de que a vida está se esvaindo a cada segundo. Creia-me, estamos morrendo agora; agora mesmo. A língua inglesa capta ainda com maior precisão o assanhamento da morte: just now! É como se estivéssemos num barco que a cada movimento das ondas fica mais e mais longe do cais. Uma viagem sem volta. Um contínuo e silencioso apagar das luzes. Um adeus sem pressa e sem alardes...
É por isso que quanto mais eu penso sobre a “hora” da nossa vida mais intolerante fico com aqueles que não vivem e também com aqueles que apenas vivem. A vida é rara e só passamos por aqui uma única vez. Aos homens está ordenado morrerem.
Fico imaginando quantas pessoas não estão absortas em seus desvarios sem se dar conta da efemeridade sem nome, sem rosto e sem aviso que as cerca e as conduz implacavelmente para o fim de todas as coisas. Não é sábio não aprender a contar os dias, a bem da verdade, a contar os minutos, os segundos, os décimos, os milésimos... Afinal, é deles que se alimentam os anos, as décadas e as eras.
Não pensar na brevidade dos dias que nos são dados é arrogância da pior espécie. Como dizia Rachel de Queirós: “somos imortais, mas não imorríveis”. Pediram a um sábio grego para que elaborasse uma verdade incontestável. Dias depois, após longas horas pensando, o sábio finalmente respondeu: “Tudo passa”.
Bingo! É isso. A vida é um milagre que não se repete. Por isso é inadmissível que não saibamos percebê-la em suas linhas suaves, sutis e traiçoeiras. Existem por detrás dos anos que celebramos uma força ainda maior que raramente conseguimos perceber. São os minutos que nos mantêm afastados da morte.
A respiração é uma função fisiológica do organismo diferente das demais especialmente pelo tempo em que pode deixar de ser exercida. Dois ou três minutos sem respirar, e o organismo começa a dar sinais de graves alterações. Se esse tempo for um pouquinho maior, será incompatível com a vida. Não respirando em dois ou três minutos, poderemos chegar ao coma e daí para a morte, o caminho é ainda mais curto.
Não são os anos que se interpõem entre o dia do nosso nascimento e o dia da nossa morte; são os minutos. Basta que esses minutos sejam antecedidos pelos numerais dois ou três; basta que eles sejam uma única vez suprimidos e, a erva verde seca-se e morre. E o que era já não é mais. E o que viera já se foi.
Principiei dizendo que somos maus contadores. E somos. Concluímos os ciclos da nossa existência a cada trezentos e sessenta e cinco dias. Pensamos no que vivemos e no que viveremos a cada doze meses. Tolice. Precisamos aprender a contar os nossos dias, as nossas horas, os nossos segundos. Não pensem que isso é insegurança ou desconfiança. Confiar em Deus ou a Deus os nossos dias não significa desaperceber-se da velocidade com que a vida flui. Ao invés de celebrarmos com festa, bolo, refrigerantes, brigadeiros, salgados, balões e línguas de sogra cada ano que subimos ao pódio da vida, deveríamos mesmo é ampliar nossa capacidade de exercer o ministério da gratidão a quem nos mantém tão perto, mas também tão longe da morte a cada dia, manhã, hora, minuto e segundo.
Dois ou três minutos. Talvez quatro ou no máximo cinco. Isso é tudo o que temos contra a morte. Razoável mesmo fui Rubem Alves ao escrever: “o relógio não desiste. Continuará a nos chamar à sabedoria. Quem sabe que o tempo está fugindo descobre, subitamente, a beleza única do momento que nunca mais será”.
O tempo voa. O tempo se vai, se esvai. Só vai, não volta.
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