Há vagas.


Weslei Odair Orlandi



Em tempos de recessão econômica o desemprego costuma tornar-se o mais medonho dos fantasmas a serem enfrentados. Frear esse espectro voraz dentro das grandes indústrias não é tarefa à altura de leigos e aventureiros. As doutrinas ideológicas do capitalismo parecem estar preparadas para quase tudo, menos para manter na mesa do trabalhador comum o seu pão diário em tempos de vacas magras. Hoje milhões de pessoas em todo o mundo já estão engrossando a fila dos despedidos; e, diga-se de passagem, a crise nem bem começou. No Brasil os pedidos de salário desemprego já se multiplicaram nas agências de seguridade social. O que vem a seguir fica difícil prever. Mas há um lugar onde as vagas não sumiram com a crise, os empregados não correm o risco de irem para o olho da rua... Aliás, para as ruas eles irão, mas não sob a égide do desemprego, claro.
Li em algum lugar que o Reino de Deus é a única agência de empregos onde há mais vagas do que candidatos. Verdade! E como há vagas! O que falta então? Por que tantas pessoas não estão ocupando essas funções? Ausência de mão de obra qualificada? Salários pouco compensadores? Divulgação precária? Muitas vagas, mas pouco campo de trabalho? Onde está o motivo para tantas vacâncias? Nas agências, ou quem sabe nos agenciadores que burocratizam os processos de seleção até conseguirem travá-lo em definitivo? Não. Creio que a resposta não esteja nisso. A crise para o estabelecimento de novos “trabalhadores” nas várias áreas de carência não é tão óbvia quanto pensamos ser. O entrave é mais sutil e ardiloso do que imaginamos.
Para se ter uma ideia de quantas vagas há pense um pouco nessa estatística: de um ano para cá até hoje nasceram aproximadamente 62 milhões de pessoas. E somente para evangelizarmos estas 62 milhões de vidas (não as outras 7 bilhões já existentes) teríamos que ganhar hoje 187 mil almas por dia. No mundo inteiro temos atualmente aproximadamente 56 mil missionários em atividade, o que significa que cada um deles teria de ganhar 8.920 pessoas a cada dia perfazendo um total de 254 milhões de pessoas para cada um deles. Claro que temos ainda pastores, evangelistas, líderes de grupos e outras pessoas mais envolvidas na evangelização. Mas considere os números. É alarmante o crescimento dos não evangelizados a cada ano. Existem hoje mais de 16 mil grupos étnicos e sociais não alcançados pelo evangelho. Só na janela 10/40 existem 1.738 povos não alcançados. Na Índia a população é cada vez maior. Com os índices populacionais sendo inflacionados a cada ano, sobe também o número de deuses. Entre os indianos há mais de 330 milhões de deuses em “atividade” – quase duas vezes a população brasileira!
Repito: HÁ VAGAS! Por que então elas não são preenchidas? Penso que a resposta deve ser encontrada nos cômodos escuros dos corações; aí está a chave para a nossa compreensão: há inversamente proporcional às vagas em aberto no Reino de Deus uma carência gigantesca de vagas nos corações. A crise de vocação para o ministério entre jovens, leigos e cristãos em geral é a raiz de todos os males. O fato de que os corações estão cheios demais com as preocupações e negócios dessa vida têm ocasionado uma geração de cristãos moucos, incapazes de se sentirem chamados. Estamos confundindo estar ocupados com estar embaraçados.
Precisamos reconsiderar questões rudimentares como o ide de Jesus. Dallas Willard explicou com precisão o problema quando chamou em seu best-seller “A grande comissão” de “A grande omissão”. O ide de Jesus não foi dado apenas aos apóstolos, tampouco foi apenas uma sugestão para fins de semana livre. A Igreja como um todo recebeu dele a ordem clara para evangelizar o mundo. Ricardo Gondim no livro Artesãos de uma nova história faz o seguinte comentário: “nunca substitua o ide de Jesus por contribua, ore (...) Ir significa ir. Se não pode ir à África, vá ao vizinho do outro lado da rua. Se não pode ir à França, vá à delegacia, aos hospitais...”.
O fato de que a grande comissão tornou-se hoje a grande omissão da igreja precisa ser fatidicamente repensada. Precisamos resignificar o chamado para os campos que estão brancos. Tenho pensado que a causa para tanto descaso está no fato de que muitos gostariam mesmo é de que Deus os chamasse para os celeiros já repletos de sementes ensacadas e não para os campos ainda áridos e à espera de que alguém os cultive.
A existência meramente física de pessoas nos templos abarrotados não faz sentido para a fome universal do divino, fome essa cada vez mais aguda entre os não alcançados dos continentes distantes e também dentre vizinhos, parentes e amigos. É inadmissível que a mentalidade cristã-evangélica funcione baseada apenas no sistema de reposição de vidas. Precisamos ser mais agressivos. Avançar é a palavra de ordem. Clamar por ceifeiros é a oração ordenada por Jesus. A atitude e disponibilidade pessoal de cada membro do corpo de Cristo buscando uma solução frente aos problemas do pecado no mundo é o antídoto certo para o refreamento dos índices alarmantes de vagas não preenchidas. Precisamos recuperar a capacidade de chorar com os que choram, de sofrer com os que sofrem, de tocar os intocáveis, de compreender os incompreensíveis, de alcançar os inalcançáveis, de atingir os inatingíveis. É dever nosso aproveitar ao máximo cada oportunidade que temos de sermos úteis no papel de trabalhadores da vinha. Não espere ser chamado quando o chamado já aconteceu. Não diga a Deus: “posso ir?”, mas “quero ir”.
O que Deus pensa a respeito da nossa participação nos processos de evangelização do mundo não é simplista nem superficial, apenas simples e compreensível, por isso mesmo absolutamente praticável por leigos, teólogos, pastores, profissionais liberais, velhos, meninos, letrados e iletrados. Afinal, que é que Ele requer de seus obreiros senão que eles sejam coerentes com a fé que professam? Senão que eles resplandeçam a luz que há neles diante dos homens, para que vejam as suas boas obras e glorifiquem Aquele que está nos céus?
Há vagas, mas e candidatos, há?

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